EM SÃO MIGUEL O ANJO

sábado, 20 de abril de 2024

MAGNÓRIOS DA INFÃNCIA

 

OS MAGNOEIROS DA CASA DO ALTO

Subindo à casa do alto, falo ao magnoeiro,

Velhinho ainda vive, a minha nespereira;

Terá mais de cem anos, no cimo do outeiro,

Calou a fome às crianças, de vida derradeira.


Amigas do lavrador, trabalhador e obreiro,

No tempo da pobreza, da fome matreira;

A canalhada subia, pela bouça e pedreira,

Pé descalço e traquina, até perto da eira…



Apanhavam do chão o fruto da nespereira,

Enganavam a fome, sempre presente,

Que diariamente teimava a aparecer;

 

No seu desenrasca tinham a certeza,

Tempo de miséria, perdido e ausente,

Que de tudo comiam para sobreviver.

José Faria

"A nespereira é uma árvore frutífera asiática, da família das rosáceas, pode atingir os 10 metros de altura…. De tronco sinuoso e copa densa, com folhas persistentes grandes e largas, com formato oblongo ou lanceolado, flores brancas e aromáticas, e frutos carnudos de cor amarelada ou alaranjada, de grandes sementes, sendo também conhecida por Biba, magnório (daí o Magnoeiro), nespereira-do-Japão, Japoneira da Europa… etc. Produz bom fruto até cerca de trinta anos. Pode durar muitos mais anos, mas dando fruto meio-seco e impróprio."

 

sexta-feira, 19 de abril de 2024

AS MINHAS MÃOS NAS ENXURREIRAS

 

ABRIL NA ESCOLA DAS ENXURREIRAS

Tomei horas e canseiras,
E cuidados mais de mil;
Na escola das enxurreiras,
Está o vinte cinco de abril.
 
Querem saber os meninos,
Que lhes contem a verdade;
Sendo embora pequeninos,
São netos da liberdade.
 
Seja adulto ou petiz,
Tudo deve ser contado,
Quem mandava no país,
Foi um dia escorraçado.
 
Dava fome aos portugueses,
Tão mau era a governar,
Porque a fome tantas vezes,
Deixou o povo a chorar.
 
Certo dia os militares,
Bem armados, dominantes;
No governo aos milhares,
Prenderam os governantes,
 
Ganhou tanta felicidade,
O povo do meu país;
Democracia, e liberdade!
Faz Portugal feliz.
José Faria – 17/04/2024
 
AS MINHAS MÃOS NAS ENXURREIRAS
 
Chamaram-me à escola das Enxurreiras,
Das primárias da minha freguesia;
Querem que conte coisas verdadeiras,
De abril, da liberdade e dessa alegra.
 
Tive o batismo de ações primeiras,
Pintaram-me as mãos, o que se fazia;
Com tintas de água, vistosas, vermelhas,
Que a professora Paula às crianças fazia.
 
As marcas de mãos encheram o papel,
Esticado no chão e muito carimbado,
Uma tela de mãos muito bem marcada;
 
Foi todo preenchido aquele painel,
Com marcas de mãos tão delicadas,
E com as minhas servindo de guarda.
José Faria

 

quarta-feira, 3 de abril de 2024

BICIGRINOS NO CAMINHO DE CANTIAGO

MEMÓRIA E DESPERTAR DE DOIS BICIGRINOS
José Faria – Carlos Silva – Caminho Central – maio.2017
 

“BOM CAMINO!”

Bom caminho é a palavra de ordem, de cumprimento, de desejo, de amizade e de salvação, pronunciada em todas as línguas, por tantas e tantos peregrinos e caminhantes de tantos países, nos caminhos de Santiago, tranquilamente em harmonia com a vida.

Já os “bicigrinos”, tem outra dinâmica e movimentos ao fazerem o caminho a pedalar, mas também outros cuidados. Por acaso são sempre mais rápidos nas descidas e caminhos planos, mas nas subidas e por estreitos trilhos e caminhos difíceis, passam a caminhar a pé como os demais, com a bicicleta pela mão ou às costas, quando o caminho é mais difícil, estreito e de piso muito incerto.

A verdade é que cada peregrino (a pé, de bicicleta ou a cavalo), está no seu caminho, observando, meditando, agradecendo, vivendo e sorrindo à vida com gratidão, muitas vezes espiritualmente, entregue aos seus pensamentos. Daí todos os cuidados para os “bicigrinos”, não só para que eles evitem quedas, mas também acidentes ao se cruzarem com os peregrinos a pé.


Por isso, devem reduzir a velocidade e pronunciar a salvação de “BOM CAMINO” em voz alta, mais que uma vez se necessário! antes de se cruzarem com os peregrinos a pé, para que estes se apercebam que se aproximam bicicletas em movimento, tantas vezes em caminhos estreitos e, aí, se necessário, levar a bicicleta pela mão, até encontrem condições de segurança para voltarem a pedalar.

A todas e todos BOM CAMINHO!

José Faria

 

terça-feira, 26 de março de 2024

Bela Quinta do Covelo


BELA QUINTA DO COVELO
 
Aprazível é a Quinta do Covelo,
Bom pulmão da invicta cidade;
O fresco do silêncio aí tão belo,
Oferece saúde e felicidade.
 
Neste caminhar que tanto zelo,
Pelo bem-estar e tranquilidade;
Entre a natureza que tanto zelo,
Encontro a paz e a vitalidade.
José Faria

“No século XVIII, a quinta do Covelo, então chamada do Lindo Vale ou da Boa Vista, pertencia a um fidalgo chamado Pais de Andrade, cujos descendentes venderam a Manuel José do Covelo, negociante. No século XIX, entre 1829 e 1830, a quinta foi vendida, pelos descendentes do Covelo, a Manuel Pereira da Rocha Paranhos e passou a ser conhecida, também, por Quinta do Paranhos. 

No século XX, a quinta foi doada à CMP e ao Ministério da Saúde, por testamento, com o impedimento de indivisibilidade e para edificação hospitalar de tuberculosos. Tendo o Ministério da Saúde prescindido de aí construir o referido equipamento hospitalar, a Câmara Municipal do Porto, gere atualmente a quase totalidade do espaço.”

Fonte: - https://ambiente.cm-porto.pt/parques-e-jardins/parque-do-covelo


segunda-feira, 11 de março de 2024

O professor, o filósofo, o ateísmo e o deísmo.

 

“O CULTO DA INCOMPETÊNCIA”

Duas páginas para reflexão! Pag. 156/157

O professor, o filósofo, o ateísmo e o deísmo.

-“É principalmente o professor, mais ainda que o filósofo, que tem mais interesse sociocultural, de animadversão e animosidade; quem acredita que tudo quanto o padre ensina, é uma invenção pura de opressores engenhosos, que querem refrear e aprisionar o povo para fundarem e manterem um dominado eterno. 

É isto que explica a ostentação que o professor faz de ideias filosóficas renovadas de Diderot e de Holbach. Chega quase a ser inverosímil que haja um professor para quem o padre não seja um scelerado.

O ateísmo é aristocrático, dizia Robespierre, lembrando-se de Rousseou; O ateísmo é democrático, exclamam os professores modernos. Qual a causa de tão grande divergência de apreciação? Do facto de a libertinagem estar em moda, entre os grandes senhores (referia-se à nobreza no século XVIII) e da crença e Deus ser unânime no povo. (XVIII). (…/…)

O ateísmo fez-se, pois, democrático, como arma contra os deístas, que, em geral, são aristocratas.

De resto, não ser restringido por nenhuma coisa, não ser limitado no seu poder soberano, é a ideia capital do povo, ou, por outros termos, a ideia capital do democrata, é que o povo não seja restringido nem limitado em seu soberano poder.

Ora, Deus é um limite, Deus é uma prisão!; e assim como o democrata não admite uma constituição secular que o povo não possa destruir e o impeça de fazer leis más, assim como não admite, servindo-se da terminologia de Aristóteles, o Governos das leis, o governo de uma legislação antiga que refreie o povo e o reprima na fabricação quotidiana de decretos; assim também não admite a existência de um Deus que tem os seus mandamentos, a sua legislação,  anterior e superior a todas as leis e a todos os decretos, que limita as veleidades legisladoras do povo, a sua caprichosa omnipotência, numa palavra; LIMITA  A SOBERANIA POPULAR!”

(…/…)

domingo, 10 de março de 2024

A MÃE NATUREZA NÃO QUER REZAS!

 A MÃE NATUREZA NÃO QUER REZAS
SÓ RESPEITO, AMOR E DEVOÇÃO!


 
A mãe natureza não se queixa, não se importa,
Nunca se sente ofendida, de tão provocada;
Até com partes do corpo de natureza morta,
Continua a promover a vida, sempre empenhada.
 
Invente o homem todo o mal que importa,
Continuando a manter a terra destroçada;
Milagrosa é a mãe terra que suporta,
Mesmo com guerra, e poluição, não está parada.
 
Ingrata é a humanidade, filha e descendente,
Que da natureza nasceu e nela se alimenta,
Que ignorante deus inventou para dominar;
 
É a Terra, que todas as vidas alimenta,
De que a humanidade continua inconsciente;
Ludibriada em fé e crenças de embalar.
José Faria
 

sexta-feira, 1 de março de 2024

VAN GOGH ANDOU NO PORTO

 

 “Eu não quero pintar quadros, eu quero pintar a vida

“Vincent van Gogh (1853-1890) foi um importante pintor holandês, um dos maiores representantes do pós-impressionismo. Van Gogh morreu praticamente no anonimato, depois de uma vida atormentada que o levou ao isolamento e finalmente ao suicídio.

Com uma trajetória difícil, cheia de problemas emocionais, Van Gogh deixou uma obra comovente e vigorosa que se constitui em um dos maiores legados artísticos da humanidade.

Infância e juventude melancólicas

Vincent Willem van Gogh nasceu em Groot Zundert, uma pequena aldeia holandesa, no dia 30 de março de 1853. Filho de um pastor calvinista, era o primogênito de seis filhos. Passou a infância melancólico e inclinado à solidão.

Gostava muito de ler, sobretudo histórias sobre os oprimidos, o que posteriormente justifica seu interesse pelo sofrimento e injustiças sociais. Em 1865 ingressou em um internato provinciano.

Desajustado no lar e insatisfeito com a estrutura da sociedade à qual pertencia, com 16 anos aceitou a sugestão do pai e foi para Haia trabalhar com o tio, que abriu a filial da Galeria Goupil, importante empresa francesa que comerciava livros e obras de arte.

Depois de três anos insiste com o tio para viajar e ver o mundo. É, então, mandado para Bruxelas, onde passa dois anos. Depois vai para Londres, sempre a serviço da galeria, onde permanece dois anos e meio.

Em 1875, Van Gogh consegue realizar seu desejo de conhecer Paris, onde julgava poder libertar-se de todas as suas frustrações. Mas não gosta do emprego. Dedica-se à leitura de livros sobre arte, forma opinião e discute com os clientes. Em abril de 1876 é demitido do grupo Goupil.”

Fonte: - https://www.ebiografia.com/van_gogh/

 

A MALDIÇÃO DO MARQUÊS - Tiago Rebelo

 A MALDIÇÃO DO MARQUÊS
                            E O TERRAMOTO DE LISBOA

De Tiago Rebelo

Muito interessante, cultural e informativa, é a caminhada ao passado; caminhar por entre as ruínas de uma Lisboa destroçada e destruída quase por completo, pelo sismo de 1755.


Ver, ouvir e acompanhar, testemunhar sem ser visto, todo um emaranhado de conflitos entre os poderes instalados, as armadilhas criadas e acusações infundadas contra nobres que incomodavam o poder de um tal ministro lacaio de D. José, que eliminava tudo e todos que dele não gostassem.

Embora já proibidas as torturas da Santa Sé, as mesmas eram utilizadas na praça pública, à martelada e queimados na fogueira por ordens do ministro Sebastião José de Carvalho e Melo, que assim se via livre de opositores, servindo de exemplo a quem não lhe obedecesse.

Pena foi ter morrido de velhice e doença, e não ter o mesmo fim de grande sofrimento e morte, como a que infligiu na praça pública a tantos nobres, filhos e criados, que dele não gostava.

Uma obra de Tiago Rebelo que me fascinou e me levou a recordar a história da tortura da Santa Inquisição, mas também, dos iguais modos de castigo levados a efeito por muitos reinados de Portugal.

José Faria

sábado, 24 de fevereiro de 2024

TUDO TEM UM TEMPO!

TUDO TEM UM TEMPO

Desde o nascer até ao perecer,
Tudo que nasce e está a viver;
Há um tempo seu de existência,

Vários são os caminhos a percorrer,
Por diversos cuidados de sobreviver,
Que só findarão com a sua ausência.

E toda a espécie que veio a aparecer,
Porque a mãe terra a quis promover,
E a ter no seu seio de coexistência;

Todas têm os seus ciclos para se valer,
Para se dar, aprender, se defender;
E se promover com mais coerência.

Só a hibernação por mais conhecer,
Desperta no silêncio, no envelhecer,
No entendimento de mais abrangência.

Tudo tem um tempo, o tempo de ver,
E há muito mais além que o obedecer,
Às normas e às rotinas de obediência.
José Faria

quinta-feira, 22 de fevereiro de 2024

DEMOCRACIA NA FILOSOFIA

 AS NÓDOAS NO PODER POLÍTICO
ESTÁ NO CULTO DA INCOMPETÊNCIA

O exercício, uso e usufruto da democracia e da liberdade inseparáveis, tem pilares difíceis de definição e até de interpretação sobre o que é mais ou menos correto, no que toda a direitos e deveres dos cidadãos.
Na minha leitura, análise e conclusões sobre o livro “O Culto da Incompetência”, de Émile Faguet, da Academia Francesa, traduzido por Agostinho Fortes, constato que já em 1919, data em que foi editado este livro, o pensamento e juízos de valor sobre as sociedades democráticas, assetam como uma luva nas idênticas questões atuais, em 2024.
 
Refere-se aí, que “o culto da incompetência”, é como uma nódoa de azeite; propaga-se por contágio, sendo, portanto, bastante natural que, sendo endémico, seja também epidémico, e que, encontrando-se no centro e núcleo do Estado, e na sua constituição, se transmita e alastre nos hábitos e costumes.
Logicamente que o teatro é a imitação da vida, e a vida, porventura, ainda mais a imitação do teatro; da mesma forma que as leis saem dos costumes, mas ainda mais estes proveem das leis.

Como bem disse Montesquieu, governam os homens, tais como o clima, a religião, as leis, as máximas do governo, os exemplos das coisas passadas, os costumes, as maneiras, resultando de tudo isto um espírito geral”.
As leis dão origem a costumes e estes a hábitos. O carácter não mudou nem nunca mudará, embora pareça e seja um tanto modificado, porque algumas das partes que estavam ocultas, vieram para o primeiro plano e as que estavam neste, passaram para segundo, verificando, pois, uma deslocação.
Veja-se este exemplo:
O sentir-se desde a infância, abaixo do pai, um chefe, alguém que domine e mande, que seja mais do que nós por direito de nascimento, dá-nos uma mentalidade particular.  Claro está que os países em que exista o direito de testar, têm costumes familiares muito diferentes daqueles em que a criança seja considerada como co-proprierária do património.
E lã está a “nódoa” de azeita a alastrar e expandir-se, tantas vezes de forma nefasta para a sociedade e contra a união da família:
Pois, notou-se já em 1919 que depois da lei do divórcio, apesar de muito justa e necessária, (embora seja uma triste necessidade), há incomparavelmente um número cada vez maior de pedidos de divórcio…e chagamos a 2024, e já o divorcio é uma coisa perfeitamente normal, quase faz parte dos usos e costumes.
Mas há outros “usos, costumes e hábitos”, que para além dos “lesa famílias”, há os lesa Estados e a democracia, face à liberdade sem responsabilidade.
Já em 1919, neste livro “O Culto da Incompetência”, os filósofos realistas e transparentes nas sua afirmações, evidenciavam incompetência dos governantes “fazedores” de leis criadores de (maus) hábitos e direitos sem deveres aos cidadãos.
- É por este processo que a democracia alarga e espalha o amor da incompetência que a caracteriza e é, por assim dizer, a sua faculdade primacial.

Foi uma distração tradicional nos filósofos Gregos descrever alegremente os costumes domésticos e pessoais que eles consideravam inspirados e mantidos pelos estados democráticos. Todos eles no assunto rivalizam com Aristofanes:
-“Estou contente comigo mesmo, diz uma personagem Xenofonte, por causa da minha pobreza:
Quando era rico, via-me obrigado a cortejar os caluniadores, com a consciência de que eu estava mais sujeito a receber deles o mal do que a fazer-lho. E depois a República exigia-me sempre alguma importância a mais, ao que eu não podia esquivar-me, porque nem licença tinha para me ausentar.
Desde que sou pobre, ganhei autoridade, ninguém me ameaça, eu é que ameaço os outros e tenho liberdade plena de me retirar ou ficar. Os ricos levantam-se quando me veem e cedem-me o passo. Era escravo, hoje sou rei; pagava tributos à República, hoje é ela que me sustenta; nada receio perder, só espero ganhar…”
 
“O Culto da Incompetência” do passado “democrático”, é a mesma doutrina política no presente.
(Por José Faria)
 

domingo, 18 de fevereiro de 2024

A GAMELA - DE HENRIQUE O'NEIL - Séc. XIX

 

A GAMELA

Homem mui velho e já tonto,
Um filho casado e um neto,
Debaixo do mesmo teto,
Nos diz um conto,
Viviam.
 
Juntos, porém, não comiam;
O velho, pois que a tigela
Quebrava
E o caldo entornava,
Comia numa gamela
De pau, e fora
Da mesa;
Com asp’reza
Era tratado
Pelo filho, e pela nora
Desprezado.
 
Um dia, ao canto da casa,
Estando o neto entretido
- era ainda pequenote –,
Muito atento a ver se vaza
Com uma goiva e um serrote
Um pedaço de madeira,
Interrompido
Pelo pai foi, que indagou
O fim de tal brincadeira.
 
- Aqui ‘stou –
Lhe responde o inocente –
A fazer uma gamela,
Qual aquela
Em que come o meu avô,
Para meu pai comer nela,
Quando for velho e demente.
 
Acrescenta mais o conto:
Revirou
O coração
Ao pai aquela lição;
Cuidadoso
E respeitoso
Desde então
Tratou
Do velhinho tonto.
 
Filhos que não respeitais
Vossos pais,
Como heis-de neles achar
Quem vos saiba respeitar?
 
Henrique O’Neil, Fabulário (Sec. XIX)
 
Do Livro de Leitura, Parte II 2º Ano
Diário do Governo, II série,
de 24-VI—1950 - preço, 22$50 (5 coroas)


 

O FRANGO, A PÉROLA E AS ALDEIAS

 

O FRANGO E A PÉROLA
 
Um pintainho andava na estrumeira,
Debicando, à procura de alimento,
Quando achou, misturado na estrumeira,
Uma formosa pérola, um portento!
 
O pinto era filósofo, decerto,
Pois afirma o honrado fabulista
Que ele ficou ali, de bico aberto,
Meditando em tal coisa nunca vista.
 
E depois exclamou, triste e mesquinho,
Cismando nos contrastes deste mundo
- e falava latim o pintainho! -,
- Tão linda coisa num lugar imundo!
 
Se algum homem te achasse, o antigo brilho
Recobraras, ó pérola manchada!
Mas eu prefiro a ti um grão de milho;
Para mim, que te achei, não vales nada.
 
Visconde de Santo Tirso (Séc. XIX)
 
AS ALDEIAS
 
Eu gosto das aldeias sossegadas,
Com o seu aspeto calmo e senhoril,
Erguidas nas colinas azuladas,
Mais frescas que as manhãs finas de abril.
 
Pelas tardes das eiras, como eu gosto,
Sentir a sua vida ativa e sã,
Vê-las na luz dolente do sol-posto,
E nas suaves tintas da manhã.
 
Alegram as paisagens, as crianças,
Mais cheias de murmúrios do que um ninho,
E elevam-nos às coisas simples, mansas,
Ao fundo, as brancas velas de um moinho.
 
Pelas noites de estio, ouvem-se os ralos
Zunirem as suas notas sibilantes;
E misturam-se o uivar dos cães distantes
Com o cântico metálico dos galos.
 
Gomes Leal. Claridades do sol. (Século XX)
 
Do Livro de Leitura, Parte II 2º Ano
Diário do Governo, II série,
de 24-VI—1950 - preço, 22$50 (5 coroas)
 
 

sexta-feira, 16 de fevereiro de 2024

O CICLO RENOVA-SE!

 O CICLO REPETE-SE OU RENOVA-SE!

Certo dia, pelas energias da vida regadas de fé, esperança e sofrimento, rompes para a vida envolto em placenta, por entre gemidos e lamentos ansiosos da tua mãe.
Os delicados cuidados de proteção iniciam-se como propósito de entrega e guarda de quem te deu à luz da vida e te aconchega como um Deus.
O tempo vai passando e vais crescendo, rodeado de cuidados, de ensinamentos, de educação.
A ama e o infantário, trabalho e mais trabalho, obrigam os teus progenitores a mais corridas, despesas, cuidados, diariamente, e a consumições perante aquelas maleitas juvenis: Chega o sarampo, o tesorelho ou papeira…
E tu menino, ficaste com febre, toda a noite choraste e os teus pais não descansaram nem puderam ir trabalhar no dia seguinte. Correram contigo para o hospital, para o centro de saúde e para médicos particulares, tantas vezes…
E lá foste crescendo saudável, com todos os cuidados e educação.
Passas-te a escola primaria, depois o secundário e continuaste para orgulho dos teus pais, e, tal como com eles aconteceu, começaste a olhar mais para o espelho e saboreares os prazeres da juventude e a alimentar a ansiedade natural da ilusão, da amizade e do amor.
A verdadeira e séria companhia de amizade e de amor para formar família, surgiu no seu tempo. E consolidou-se o propósito de ambos na união matrimonial.
A satisfação e orgulho dos progenitores elevou-se como que se o objetivo alcançado fosse também seu.
Maior alegria foi sentida pelos parceiros quando chegou o “rebento” daquela união, da vossa união, que os fizeram avós pela primeira vez.
O ciclo repete-se ou renova-se.
A nova família segue o seu curso natural, tal como aconteceu com vossos pais, de entrega, de empenho e cuidado para com a sua primeira descendência.
Para trás ficaram as lembranças, recordações e ensinamentos dos cuidados que receberam.
O ciclo repete-se ou renova-se.
 
O tempo não para de seguir o seu curso de ensinamento, de valores de união, de família, de sangue da mesma estirpe.
Só na mente, no pensamento distraído e orgulhoso, tantas vezes evidente na juventude, minado de vaidade e de alguma ostentação, leva ao temporário esquecimento do caminho percorrido e de entrega, da luta constante por aqueles que os trouxeram ao mundo.
O rever, reconhecer e o despertar da história, dos seus primeiros passos de vida até à juventude, só acontecerá quando, já sós ou só, se encontrarem próximos do fim da sua jornada existencial.

José Faria